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O mote inicial do laboratório vem, curiosamente, de uma admiração por atelieres de artistas visuais. Não tanto pelo espaço físico em si, mas pela ideia que ele reúne: a de que neste lugar o artista, além de trabalhar com a produção propriamente dita de suas obras, também leva a sua relação com a linguagem a voos cada vez mais ousados. Lá ele investiga e experimenta vastamente o princípio estrutural de seu fazer e o desdobra infinita vezes de tal modo e a cada novo ato de criação que, entre seu corpo, o instrumento que utiliza e a materialidade que seu ato modifica, surge uma intimidade sensível única. Mesmo que a ideia do atelier se reporte tão forte ao contexto tradicional das artes visuais, em outras linguagens como a música, a literatura e a dança ela está, de certo modo, também absorvida no entendimento comum de que ao artista cabe o retorno insistente ao fazer de sua Arte e, nesse sentido, um compromisso contínuo com o estudo, independentemente de qualquer circunstância. 

Muitas vezes, para o ator, a sala de trabalho vazia é um conflito angustiante, pois ela o coloca, de forma crua, diante da especificidade mais preciosa de sua criação e a mais difícil de se trabalhar: seu fazer é um ato de luta contra o contínuo desaparecimento que o tempo efêmero provoca na própria materialidade de que é feita suas ações. Sobretudo porque é o corpo o lugar onde este ato se realiza e, como bem sinaliza Maria Rita Kehl, é ele quem está em relação direta, de existência e de ação, com esta partícula fugidia e irrepresentável que é o presente. O corpo é o instrumento do ator através do qual se fazem contínuos atos evanescentes e com os quais ele produzirá uma linguagem artística, uma espécie de idioma sensível das ações.

Assim, se o fazer do ator se constitui do manuseio dessa materialidade, como então deveria ser o seu atelier de criação? Como atores poderiam criar uma forma análoga de atelier em que seus voos com a linguagem se tornassem práticas cotidianas e que seu estudo não abdicasse do paradoxo que se funda nas imbricações de sua artesania de corpo-ato-evanescência? O Laboratório Dramaturgias do Corpo surge em resposta a essa pergunta com o objetivo de tentar criar este atelier para o ator e seu profundo processo de descoberta da linguagem.

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